Há
muito, muito tempo, havia no Japão um templo aos pés
de uma montanha. Nesse templo, moravam um monge e um kozo (menino
aprendiz de monge). Certa ocasião, o monge disse ao seu
auxiliar que fosse à floresta para apanhar flores, pois
o dia seguinte seria o Shunbun no Hi (Dia do Equinócio
da Primavera) e era preciso deixar o altar muito bonito, pois
os fiéis viriam rezar. Muitas oferendas seriam trazidas
por eles, principalmente ohagi, que é uma pelota de arroz
branco coberta com pasta de feijão azuki, pois os espíritos
dos antepassados das famílias japonesas juntam-se em volta
das oferendas alimentícias.
Sim, senhor disse Kozo, enquanto se preparava para sair
em busca das flores.
Vou lhe dar três omamori (talismã protetor) especiais,
pois existem na floresta monstros ferozes, como a Yamanbá
(bruxa) e o Tengu (gênio da montanha). Se qualquer coisa
perigosa acontecer, atire o talismã no chão e peça
um encanto dizendo uma palavra que você deseja para o momento.
Se você quiser um oceano, diga exatamente: venha oceano
e haverá um oceano.
Sim disse o menino.
Pegando
os talismãs encantados, ele saiu do templo. Na montanha,
as flores da primavera surgiam por toda a parte. Eram flores grandes
e vermelhas que chamavam muito a atenção. Kozo examinou-as
seletivamente, procurando saber qual delas colher, pois todas
eram lindas. Como estava difícil dizer qual era a mais
bonita, tentou fazer uma escolha por tamanho. Procurou pela maior
delas, mas que também fosse bonita. O menino finalmente
chegou a uma moita de flores onde todas eram grandes, acima até
de sua altura.
Vou ficar com esta pensou Kozo Não, aquela
é maior ainda! Oh! A outra lá atrás é
maior e mais bonita! assim, o menino foi se embrenhando
na floresta, completamente embriagado pela beleza das flores.
Quando se deu conta da situação, a noite já
vinha chegando.
Oh! Está escurecendo, preciso voltar correndo, senão
não vou enxergar o caminho.
Kozo
deu meia volta e começou a andar com pressa, mas logo percebeu
que não havia passado por ali quando veio. Tentou ir para
um lado e para outro, mas entendeu que já não conseguia
saber o rumo do templo. Começou a ficar apavorado, caminhando
sem direção e apressadamente. Nessa altura dos acontecimentos,
o sol já havia desaparecido e a floresta era completa escuridão.
O menino
pensou em gritar pedindo socorro, mas lembrou-se que seus gritos
podiam atrair as feras e resolveu que andaria até encontrar
algum lugar conhecido. Depois de caminhar um bocado, viu uma luz
brilhar entre as árvores no alto da montanha.
Que bom, deve ter alguém morando lá! disse,
aliviado, o menino e resolveu ir pedir ajuda. Foi em direção
à luz até que pôde distinguir uma janela de
cabana. Era de onde vinha a claridade. Kozo agradeceu ao Buda
em pensamento e aproximou-se do casebre.
Boa noite. Sou o Kozo. Perdi o caminho de volta ao templo e peço
que me deixe passar a noite aqui.
Uma
estranha voz se fez ouvir e a porta foi aberta. Era uma velha
Yamanbá de aspecto horroroso quem atendeu a porta. Assim
que viu o menino, a Yamanbá esfregou as mãos uma
na outra e disse:
Oh! Um belo menino entre, entre. Então está perdido
nesta densa floresta? É um terrível problema.
Kozo
sabia que estava encrencado, mas não havia nada a fazer,
senão tentar ser agradável com a Yamanbá
e não despertar sua fúria.
Dentro
da casa, ele tomou uma sopa do caldeirão da Yamanbá
e pensou:
Vou dar no pé quando ela dormir.
Porém,
na hora de dormir, a velha Yamanbá deitou-se ao lado de
Kozo, aparentemente para vigiá-lo. Então, o garoto
fingiu que estava dormindo, roncando bem alto durante alguns minutos.
Depois, tentou ver os olhos da Yamanbá, que lhe pareceram
fechados. Para certificar-se, disse baixinho:
Yamanbá-san, Yamanbá-san...
O que é? perguntou a bruxa com voz repreensiva.
Eu preciso ir a casinha. Acho que sua sopa de ervas foi muito
forte para mim disse Kozo, para justificar o fato de tê-la
chamado.
Alegando
que era para não se perder na escuridão, a Yamanbá
amarrou uma corda na cintura de Kozo e indicou a direção
da casinha, que ficava fora da casa, e ficou deitada segurando
a outra extremidade da corda.
Chegando
na casinha, imediatamente Kozo desatou o nó e amarrou a
corda numa viga. Em seguida, curvou-se e suplicou com todo o fervor:
Senhor deus da casinha! Senhor deus da casinha! Por favor, eu
lhe peço, se a Yamanbá me chamar, diga apenas: um
minuto que já vou... (bost! bost!) Eu imploro, por
favor...
Assim,
Kozo saiu de fininho, engatinhando apressadamente entre os arbustos.
Continua...
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