Antigamente
no Japão havia muitos vendedores ambulantes que levavam
as mais distantes aldeias, vários produtos que só
era possível encontrar apenas na capital. Certa ocasião
um desses vendedores, cujas mercadorias que vendia eram chás
e produtos de beleza femininos, andava nos atalhos de uma montanha,
e ficou perdido no meio da mata. Havia então um enorme
bambuzal que parecia não ter fim. Enquanto se esforçava
para atravessar o bambuzal, o vendedor ia lamentando a sua falta
de sorte.
-Além
de não conseguir vender nada, ainda fui me perder...
Depois de muito esforço e ganhar alguns arranhões
nos braços, o vendedor finalmente conseguiu chegar a uma
enorme clareira cor de rosa. Havia ali grande quantidade de cerejeiras
em flor que espalhava no local uma deliciosa flagrância.
O vendedor
de chás respirou fundo e se deliciou com o agradável
perfume que fazia ele esquecer o cansaço da longa e árdua
caminhada. Nisso alguns rouxinóis começaram a cantar
nos galhos das cerejeiras.
-Nossa,
isso parece o Toguenkyô, o Paraíso Terrestre!
-Disse o vendedor de chás se maravilhando em vários
sentidos: com os ouvidos acompanhava o harmônico canto dos
rouxinol; com o olfato absorvia o delicioso perfume das flores;
a visão se extasiava com o céu cor de rosa coberto
de flores da cerejeira e o tato experimentava a leveza das pétalas
que desprendiam dos galhos, e choviam como flocos de neve, pousando
levemente, na sua cabeça, ombro e braços. E o rapaz
se deixou levar pela sensação maravilhosa que estava
experimentando, deixou sua caixa de chás no chão
e começou a dançar ao som dos rouxinóis.
Abriu
os braços em gesto generoso e dançou, dançou,
dançou, com gostoso sorriso nos lábios até
cair de costas no grosso tapete de pétalas. Sentia-se feliz
como nunca. Então suspirou o vendedor:
- Ah!
só falta a companhia de uma linda garota para completar
este cenário perfeito! Daí, como num passe
de mágica, de trás dos troncos das cerejeiras surgiram
quatro lindas garotas que cercaram o moço deitado.
- Devo estar sonhando - raciocinou o vendedor.
Sem
nada dizer, as garotas o levantaram pelos braços e conduziram
para um lindo palacete. O vendedor notou que havia uma grande
curiosidade por parte das moças, em conhecer os produtos
que ele trouxera e começou a mostrar. Havia além
dos vários tipos de folhas trituradas para chás,
cosméticos, pentes, enfeites para penteados e vários
produtos femininos.
As
moças ficaram encantadas com as mercadorias e manifestaram
desejo de comprar vários produtos. Nisso adentrou a sala
uma bonita senhora que se apresentou como Shizen, dona do palacete
que tinha seu nome e era a mãe das quatro lindas garotas.
Ato seguinte a senhora Shizen comprou todas as mercadorias.
Sem
dúvida nenhuma a sorte tinha mudado para o vendedor. Produtos
que não havia conseguido vender em uma semana de exaustiva
caminhada, foram vendidos em alguns minutos como num passe de
mágica. Quando agradeceu a todas pelas compras e se preparava
para partir, a senhora lhe disse:
- O
dia está acabando e o caminho de volta é longo.
Na escuridão da mata poderá se perder. Por favor,
aceite nossa hospedagem.
O vendedor
não pensou duas vezes. Aceitou imediatamente a boa oferta
e foi conduzido a um quarto do palacete. Haviam acontecido muitas
coisas para um só dia. Bastou deitar para sentir uma canseira
gostosa e logo pegou no sono.
Na
manhã seguinte, durante a refeição matinal,
dona Shizen fez uma surpreendente proposta ao vendedor.
- O
senhor já deve ter percebido que neste palacete só
vivem mulheres. Eu e minhas quatro filhas: Haruko, Natsuko, Akiko
e Fuyuko. Gostaria que ficasse a vontade pelo tempo que quiser.
Mais que isso, gostaria que casasse com uma das minhas filhas.
O
jovem vendedor que sempre foi uma pessoa pobre e solitária
não podia deixar passar uma oportunidade maravilhosa como
aquela. Um rico lar e uma bela esposa. Assim concordou em casar
com a filha mais velha, Haruko, cujo nome significa Filha
Primavera. Foi uma cerimônia simples mas maravilhosa.
Sob as vistas da bela e imponente mãe Shizen, as irmãs
de Haruko dançaram para o casal, enquanto a noiva servia
saquê para o noivo.
Sua
vida mudou completamente. Já não precisava andar
milhas e milhas oferecendo chás e cosméticos para
pobres lavradores, para ganhar alguns trocados. Naquele maravilhoso
palacete nem dinheiro precisava. Passava o dia ouvindo músicas
de shamisem e koto tocadas pelas garotas, jogando cartas e criando
poesias. Era feliz. Vivia um sonho.
Bem
dizem que quando se é feliz, o tempo passa em incrível
velocidade. Um ano se passou num piscar de olhos. O cheiro do
ar denunciava a chegada da primavera. Ao acordar naquela manhã
e dirigir-se ao refeitório do palacete, encontrou a mãe
e suas quatro filhas vestidas em lindos trajes de gala.
- Vamos
ao Hanami (ritual de apreciação das flores de cerejeiras),
por favor tome conta do palacete para nós., disse
a senhora ao genro e antes de sair complementou: Se ficar
entediado de ficar sozinho, pode abrir e espiar um pouco, três
dos quatro portões que existem salão principal,
para se distrair. Porém o quarto portão você
não deve abrir em hipótese alguma. Não está
autorizado. Promete que não vai abrir?.
- De
jeito nenhum.
- Ótimo, então até à tarde.
Continua...
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