Há
muitos e muitos anos, no mosteiro budista Morin-ji, na província
de Gunma, residiam um pacato monge, que todos o chamavam de Osho-san,
e vários discípulos.
Certa
ocasião, um sucateiro de nome Jimbei passou pelo mosteiro,
acompanhado de sua filhinha, para mostrar alguns artigos que tinha
para vender.
- Bom
dia, Osho-san, vejo que está cuidando de bonsais floridos!
- Bom dia, as azaléias satsuki estão se abrindo
para esse maravilho sol! Qual novidade o traz até aqui,
Jimbei?
- Lembra-se
que me pediu para conseguir uma boa chaleira de ferro? Pois veja,
Osho-san, que linda chaleira caiu em minhas mãos. Não
acha ideal para a cerimônia do chá? Gostaria de ter
sua opinião sincera a respeito dessa bela peça.
- É
realmente uma bela e sólida chaleira. Não precisa
gastar saliva de vendedor que a peça fala por si só.
Diga o preço e a chaleira fica para o mosteiro.
O monge
comprou a chaleira e ficou muito satisfeito com a aquisição:
- Incrível, quanto mais vejo, mais gosto desta chaleira.
Ela tem uma aura inexplicável.
O monge
não cansava de apreciar o objeto, olhando de frente, de
cima e por todos os lados. Resolveu, então, ferver água
para preparar um chá. Encheu a chaleira de água
e colocou sobre o braseiro (irori) que ficava no meio da sala.
Enquanto
esperava a água ferver acabou cochilando, sentado. Passado
um tempo, a água começou a querer ferver e de algum
lugar soou uma voz estranha:
- Ai, está quente Osho-san! Está quente!
Osho
estava dormindo e não ouviu nada, porém os meninos
aprendizes que passavam pelo corredor ficaram curiosos ao ouvir
aquela voz desconhecida. Resolveram, então, espiar para
ver quem estava conversando com o monge e abriram devagarzinho
a porta corrediça.
Quando
botaram suas cabeças raspadas para dentro da sala levaram
um tremendo susto. A chaleira estava com quatro patas, um rabo
felpudo e além do mais movia-se desesperadamente para sair
de cima das brasas.
- Nossa,
uma chaleira assombrada!
- É coisa do demônio. Acorda Osho-san!
Ao
despertar assustado com a gritaria de seus discípulos,
deparou-se com uma cena inusitada que o deixou boquiaberto. A
chaleira tinha cabeça de texugo e saltou fora do braseiro,
espalhando brasa por toda a sala. Saiu correndo pelos corredores
do mosteiro a gritar:
- Aiii,
está quente! Me queimou!
O monge, refazendo-se do susto, também gritava:
- Chaleira encantada é ilusão provocada por um texugo.
Ao
ouvir que se tratava de um texugo, os aprendizes de monge correram
atrás da chaleira com vassouras para pegá-lo. Nessa
época era comum raposas e texugos se transformarem ilusoriamente
em gente ou objetos para enganar os homens.
O templo
virou uma bagunça, era correria pra lá e pra cá
atrás do texugo. Até que certa hora o bicho desapareceu.
- Perdemos
de vista, acho que fugiu para a mata. Vamos dormir, ele nos deu
uma canseira danada.
Na manhã seguinte, quando o monge acordou, percebeu que
a chaleira, tal como comprou, estava na estante onde ele deixara.
- Será
que foi um sonho? Ou essa chaleira é um texugo encantado?
Porém, olhando de vários ângulos parecia uma
chaleira normal.
Nesse
momento o sucateiro Jimbei chegou ao mosteiro apavorado.
- Desculpe-me por te enganar, Osho-san. A chaleira que vendi ontem
para o senhor não é uma chaleira e, sim, um texugo
encantado.
- Oh,
então não foi um sonho. Quando a coloquei sobre
a brasa o bicho saiu esperneando feito um doido.
- Pobre
texugo, deve estar todo queimado. Minha culpa, fui duplamente
irresponsável.
- Calma Jimbei, conte-me o que aconteceu.

Continua...
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