O
MOTI QUE DESAPARECEU
Por cúmulo do azar, a cabana onde o Ushikata havia
se refugiado para se proteger de Yamauba era dela própria.
- Pretendia
conseguir ajuda nesta cabana, porém, a situação
está pior do que antes. Estou terminantemente perdido,
pensou Ushikata juntando as palmas das mãos e rezando para
todos os deuses e a todos os budas, pedindo salvação.
- Sei
que estou perdido, pelo menos salvem minha alma.
A bruxa, sem saber que sua vítima estava sobre sua cabeça,
sentou-se à beira do irori (braseiro no meio da sala) e
começou a assar vários motis (bolinho de arroz glutinoso).
- Estou
com fome, asse logo, motizinho. Dizendo isso, a bruxa ficou aguardando
os motis ficarem no ponto. Nisso, começou a sentir uma
sonolência e cochilou.
No alto da casa, entre as vigas, Ushikata estava com a barriga
roncando de fome.
- Ora,
ora, a Bruxa adormeceu. Acho que vou me servir de um moti, pensou
o vaqueiro, puxando uma taquara comprida do telhado e espetou
um bolinho de arroz do fogareiro. Como estava com muita fome,
o moti lhe pareceu especialmente gostoso. Não resistindo,
espetou outro e, em seguida, outro. E assim, sucessivamente, acabou
comendo todos os motis da velha bruxa.
Pouco
depois, a Yamauba despertou. Pensou em comer os motis que deviam
estar bem assados, porém, notou que haviam desaparecido.
- Ué, os motis sumiram!
Começou
a fuçar no meio da cinza, mas nada de encontrar os bolinhos.
- Que coisa estranha. Será que enquanto eu cochilava o
texugo do bambuzal levou meus motis embora? Não, isso é
impossível. O texugo e a raposa me obedecem cegamente,
não teriam coragem de me roubar. Mas então quem
foi que me roubou? Yamauba se levantou e foi verificar todos os
cantos da casa. Andando de um lado para o outro foi ficando nervosa.
-Quem
está aí? Tem alguém em minha casa?
O vaqueiro, que escondido na viga do telhado tinha saboreado os
gostosos motis, fez uma voz fina, imitando o vento e disse:
- Quem
comeu foi o Deus do Fogo, foi o Deus do Fogo.
- Ah, se foi o Deus do Fogo, não posso fazer nada, disse
a bruxa conformada.
Lá
fora, uma enorme lua iluminava a noite. Yamamba trouxe um caldeirão
e colocou-o no fogo dizendo:
- Estou com fome, acho que vou preparar um amazake (saquê
adocicado que se bebe quente) e beber.
Daí
começou a preparar o saquê doce, dissolvendo bagaço
de arroz fermentado na água quente. Enquanto esperava o
líquido ferver, começou a cochilar, balançando
a cabeça para frente e para trás.
Como
comeu muito moti, o vaqueiro começou a sentir a garganta
seca. Olhando para baixo viu que a bruxa estava novamente cochilando.
Nisso, o vapor que subia do caldeirão espalhou o gostoso
aroma de amazake no ar.
- Acho
que vou me servir desse amazake.
Novamente pegou do telhado uma vara de taquara comprida e abaixou
a ponta para dentro do caldeirão. Lá de cima começou
a sugar na outra ponta e foi tomando todo o conteúdo, que
estava uma delícia.

DERROTANDO
YAMAUBA
Passado um tempo, a bruxa da montanha despertou.
-Ué! Onde foi parar o amazake?
Yamauba olhou desconfiada para os lados e levantando disse:
- Quem foi o desgraçado que tomou meu amazake? Quem foi?
Novamente o vaqueiro soltou uma voz imitando um deus.
- Fui eu, o Deus do Fogo, o Deus do Fogo.
- Oh!
Sim, se foi o Deus do Fogo, fazer o quê?! Meu apetitoso
jantar fugiu, comeram meu moti e beberam meu amazake. O melhor
que tenho a fazer hoje é dormir cedo. Esta é uma
noite sem graça, uma noite cansativa.
A bruxa
entrou em um baú para dormir. Minutos depois era possível
ouvir um ronco alto vindo do baú. Então o Ushikawa
desceu silenciosamente do telhado e foi de mansinho perto do baú.
Ao lado do baú havia uma chave e o vaqueiro tratou de trancar
a tampa do baú. E disse para si mesmo:
- Monstro
como essa bruxa que vive atormentando as pessoas não devia
existir.
Em seguida, trouxe um bule da dispensa e colou água para
ferver no irori (braseiro). Foi até o fundo da casa, trouxe
um furador e começou a fazer um buraco na tampa do baú.
Devido ao barulho da furadeira, a bruxa despertou dentro do baú.
- Que
barulho é esse fazendo kiri, kiri? Ah! Deve ser o bicho
carpinteiro. Cantando assim à noite é sinal de que
amanhã vai fazer tempo bom, comentou a bruxa e tornou a
dormir.
Passado
algum tempo, a água da chaleira começou a ferver.
O vaqueiro despejou toda a água fervendo para dentro do
baú através do buraco. Um berro horrível
saiu de lá dentro, seguido de uma barulheira infernal.
Depois de instantes, tudo voltou ao silêncio.
- Vinguei
o meu estimado boi, disse o Ushikata, saindo em direção
de sua aldeia.
Fim.
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