(Por Iolanda
Toshie Ide*)
A agroindústria
emprestou do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDES) R$ 17,2 bilhões, mas, antes de completar um ano,
já demitiu quase 10 mil trabalhadores. Só o Frigorífico
Independência dispensou 6,3 mil e pretende continuar. A Sadia, por
sua vez, dispensou 6 mil terceirizados e mais 350 do quadro da empresa.
A Vale do Rio Doce tomou R$ 4 bilhões dos cofres públicos
e demitiu 1,3 mil.
As Medidas
Provisórias 435 e 450 objetivam o desvio de recursos vinculados
legalmente às áreas sociais para pagar a dívida pública,
que nunca foi objeto da auditoria prevista na Constituição
Federal. Assim, continuará faltando dinheiro para creches, escolas,
pesquisa, leitos hospitalares, medicina preventiva, combate à dengue
e reajuste dos salários de profissionais das áreas sociais.
De novembro
de 2008 a fevereiro deste ano, o agronegócio já demitiu
268.888 trabalhadores a despeito dos mais de R$ 17 bilhões tomados
do BNDES. Há uma previsão de R$ 7,2 bilhões do Pronaf
para a safra 2008/2009, para 1,2 milhão de famílias de pequenos
agricultores.
A FAO (órgão
da ONU para Alimentação e Agricultura) informa que 70% dos
alimentos são produzidos por pequenos agricultores. Ademais, é
um dos setores que mais geram empregos além de fortalecer a soberania
alimentar.
Não
bastasse tudo isso, o referido banco anunciou a liberação
de mais R$ 10 bilhões com juros de pai para filho. Parte pode ir
para a folia financeira ou para os paraísos fiscais. Outra parte
irá para que as patas do gado, a can e o eucalipto continuem avançando
sobre florestas naturais, destruindo cerrados, reservas amazônicas,
além de subtrair terras altamente férteis, onde até
então se produzia alimentos em abundância. Ou seja, não
importa a preservação de nossos ricos biomas. Só
o lucro interessa, ainda à custa do dinheiro público.
Quando se iniciou
a democratização fundiária na década de 50,
esperava-se que, após 30 anos, não haveria mais agricultor
sem terra. Passado meio século, a concentração fundiária
aumentou, a despeito da população ter crescido muito. Isso
mostra que ainda estamos muito distantes da democracia, a despeito dos
20 anos da nova Constituição. Hoje, com mais de 80% da população
vivendo na zona urbana, uma multidão de trabalhadores rurais continua
sem um pedaço de terra onde se fixar e plantar.
Quando estive
no Japão, no ano passado, uma professora universitária ficou
estarrecida ao tomar conhecimento de que, no imenso Brasil, há
quem queira plantar e não tenha terra. O mesmo ocorreu na França
quando, em Giverny, uma turista estadunidense me perguntou sobre a sigla
MST, que vira numa foto do Fórum Social Mundial.
Enfim, o que
parece natural no Brasil é repentinamente desconstruído
como tal quando se é interpelado por alguém que não
naturaliza o que de fato nada tem de natural, muito menos a equivocada
opção pelo agronegócio, que concentra ainda mais
a terra nas mãos dos privilegiados de sempre.
|