Goga
Masuda, patrono do haicai brasileiro
Mestre foi o único que conseguiu
legar à nova terra os valores do haicai, completando
a missão de Nempuku Sato
(Por:
Edson Kenji Iura*)
As
artes tradicionais japonesas, por seus valores universais,
há muito conseguiram ultrapassar suas fronteiras
geográficas, derrubando barreiras de etnia e cultura.
No Brasil, como em muitos países, há admiradores
entusiasmados e praticantes dedicados de ikebana, artes
marciais, bonsai, sumiê ou cerimônia do chá,
tanto na comunidade nipo-brasileira como fora dela. Quanto
ao haicai, a poesia japonesa de expressão breve
e ligada à natureza e às estações,
só tardiamente iniciou sua divulgação
sistemática para além do círculo
dos imigrantes que o praticavam. Goga Masuda (19112008)
é um nome fundamental no desenvolvimento do haicai
em língua portuguesa.
Trajetória
Como
tantos outros japoneses, Goga Masuda veio para o Brasil
em busca de uma nova vida. Conheceu o mestre Nempuku Sato
(18981979) em 1935, tornando-se seu discípulo
na arte do haicai. Nempuku foi um imigrante como Goga,
encarregado de cultivar essa poesia no Brasil por ninguém
menos que Kyoshi Takahama (18741959), a figura dominante
do haicai japonês durante toda a primeira metade
do século 20. Além de tornar-se um praticante
desse gênero literário, Goga colaborou intimamente
com seu mestre na divulgação do haicai,
especialmente depois da Segunda Guerra, quando se tornou
jornalista na então florescente imprensa nipo-brasileira.
Os
imigrantes japoneses não foram os responsáveis
por apresentar o haicai aos brasileiros. A primeira informação
dessa poesia foi introduzida por livros franceses e ingleses.
Foi a partir dessa base que poetas do Brasil tentaram
escrever haicais em português, a partir das primeiras
décadas do século 20. Desde esse tempo,
a idéia que os brasileiros tinham do haicai era
a de uma forma poética breve, a ser preenchida
com um pouco de humor, sabedoria proverbial ou iluminação
zen-budista.
Difusão
Já
a divulgação, entre os brasileiros, do haicai
enquanto arte tradicional, conjunto de técnica
e filosofia que pode ser ensinado a qualquer pessoa, encontrava
seu grande obstáculo na língua japonesa,
sua matéria-prima, mas que, paradoxalmente, deveria
ceder lugar ao português. Por isso, foi necessário
esperar o surgimento de um mestre que, mais do que repassar
a tradição, fosse capaz de adaptar o modelo
original a uma nova língua, mantendo intocados
seus valores fundamentais.
Ao
contrário de Nempuku, Goga dominava o português.
Por isso, não limitou sua atividade ao universo
dos imigrantes, mantendo sempre intensa troca de informações
com poetas e intelectuais brasileiros sobre a possibilidade
de se escrever haicais nessa língua. Esse intercâmbio
culminou com a fundação do Grêmio
Haicai Ipê, em 1987, grupo de poetas brasileiros
que, sob sua orientação, serviu de plataforma
para o desenvolvimento de uma poesia escrita em português,
ainda que firmemente ancorada nos valores de objetividade
e respeito à natureza, característicos do
haicai tradicional.
Há
muitos mestres-imigrantes ainda em atividade no Brasil.
Mas Goga Masuda foi o único que conseguiu legar
à nova terra os valores do haicai, completando
a missão de Nempuku Sato.

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