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Arte em Letras
Matéria publicada no Zashi edição 10 - Junho de 2008

Oswald de Andrade e a imigração japonesa
O drama dos filhos dos imigrantes que viviam nas colônias foi mostrado como a integração e a adaptação à nova realidade

(Por: Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior*)

Embora a imigração japonesa seja um dos temas principais dos dois romances de Oswald de Andrade, Marco Zero I (Revolução Melancólica) e Marco Zero II (Chão), não podemos dizer que esse seja “o” grande romance da imigração japonesa. Por sinal, parece-me que não existiu tal romance.

Enredo

A imigração japonesa apareceu em Marco Zero representando um perigo ao qual a antropofagia cultural proposta pela narrativa de Oswald de Andrade reagiu. Se, com a grande depressão de 1929, o Brasil ficou “hipotecado ao imperialismo estrangeiro”, o romance apresentou a “antropofagia comunista” como antídoto tanto para as injustiças sociais como para a rigidez ortodoxa dos comunistas brasileiros, comparados, nesses romances, aos positivistas do tempo da República Velha, ou seja, seriam grupos inadaptados e destinados a serem expulsos do organismo social e político nacional.

O mesmo raciocínio exigido para as idéias positivistas e comunistas foi cobrado dos japoneses. Eles não poderiam se tornar colônias isoladas no território. Esse diagnóstico a respeito dos japoneses centrou-se na necessidade da integração cultural, diferente da ênfase nos maus-tratos aos imigrantes dada por muitos autores que abordaram o tema, como por exemplo, Memórias de um Colono no Brasil, de Thomas Davatz, e Hello Brasil: Notas de um Psicanalista Europeu Viajando ao Brasil, de Contardo Calligaris. A luta dos imigrantes pela ascensão social foi outro tema associado a esses relatos. As narrativas enfocaram o momento em que os colonos chegavam e eram maltratados nas plantações.


Identidade e multiculturalismo

Os dois romances Marco Zero vão por outro caminho para enfocar a imigração japonesa: seguem a linha de Canaã, de Graça Aranha, livro de 1901 do autor que tratou da imigração alemã no Espírito Santo sob o aspecto da integração entre culturas e raças. Nos volumes de Marco Zero publicados durante a Segunda Guerra Mundial (o primeiro, Revolução Melancólica, em 1943; o outro, Chão, em 1945), a imigração japonesa surgiu a propósito do debate sobre a integração entre as culturas e a mistura racial. Oswald propôs, por meio desses romances, a adaptação do imigrante japonês no Brasil. Afinal, Oswald foi o grande teórico da antropofagia no sentido metafórico, ou seja, um elogio ao multiculturalismo e à mestiçagem.

Em Marco Zero, Oswald contrapôs a chegada do japonês à do sírio-libanês e preconizou, indiretamente, que o japonês se abrasileirasse, como fez o sírio Salim Abara e sua esposa brasileira, D. Zilé. O japonês, por sua vez, trazia “a cooperação e o dumping. Enquistava-se na terra do caboclo.” A relação entre os brasileiros e os colonos japoneses teria, portanto, dois lados: cooperação e concorrência desleal. Dr. Sakura, um japonês culto, defendeu os seus patrícios da acusação de concorrência desleal: “Todas nação proíbe entrada de produto japonês. Disque é dumping, mas não é porque pobereza perecisa de comê, vende maise borato” (sic). Portanto, a defesa dos japoneses foi perante a concorrência desleal, mas não em relação à mestiçagem.

O conflito de identidade provocado por essa não-integração teve lugar, em Marco Zero, principalmente dentro da escola primária: o problema foi justamente a identificação dos filhos dos colonos japoneses. Ilustrou-se esse conflito quando o filho de Muraoka, Fusiko, rompeu em lágrimas ao ser obrigado a se dizer brasileiro pela professora, que inventou uma “chamada patriótica”. O drama dos filhos dos imigrantes que viviam nas colônias foi mostrado como sendo a integração e a adaptação à nova realidade. Por isso, Marco Zero não foi uma narrativa épica da colonização japonesa, e sim uma narração crítica, inserida entre a Revolução de 32 e a Revolução Socialista.


*Graduado em Filosofia e mestre em Estudos Literários. Doutorando em Teoria e História Literária pela Unicamp.

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