Hayashi:
Empregadores não querem relação direta
com brasileiros |
(Reportagem
e Foto: Helena Saito / ipcdigital.com)
Em 2008,
a jornalista japonesa Haru Sugiyama, 51, publicou o livro-reportagem O
retorno dos imigrantes Nikkeis que voltam da América do
Sul (Imin Kanryuu Nambei kara kaette kuru nikkeijin-tachi), no
qual relata os três anos de pesquisa em que passou às voltas
com a comunidade brasileira. Interessada em questões sociais, ela
revisou casos de crimes famosos, como o do assassinato de Sonia Misaki
e de seus dois filhos, em 2006, falou sobre os problemas enfrentados pela
comunidade e foi até o Brasil para ver como está a primeira
geração de imigrantes japoneses que lá residem. Quanto
aos crimes, ela avisa: A intenção não foi criticar
a comunidade brasileira, nem apontar seu aspecto negativo, mas procurar
entender o motivo.
Uma das conclusões
de Sugiyama é que orgulho e respeito pelo próximo são
necessários para a convivência de diferentes povos. Ela também
aponta a importância de valorizar a próxima geração
que sofre com a baixa autoestima e a dificuldade para se adaptar
à escola e à sociedade japonesa.
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De onde
surgiu a ideia de escrever um livro sobre os brasileiros no Japão?
Haru Sugiyama: Um dos motivos foi meu desejo de retratar os problemas
de educação e de evasão escolar entre as crianças
brasileiras. Isso porque, quando fazia um trabalho para a revista Nihongo,
publicada pela ALC, conheci uma professora de japonês no Homi Danchi,
em Toyota (Aichi), que me contou sobre o grande número de brasileiros
que deixam os estudos. Também quis mostrar uma realidade não
divulgada pela imprensa. Eu estive em Registro (São Paulo) em 1980,
com meu pai, que participou de um projeto da Jica como técnico
agrícola. Permaneci lá por dois meses. Foi nessa ocasião
que soube de muitos casos de imigrantes japoneses que, apesar de terem
passado por inúmeros sofrimentos, não se consideram bem-sucedidos.
Nos primeiros
capítulos, a senhora descreve alguns crimes cometidos por brasileiros
no Japão. Pode falar um pouco mais sobre eles?
Sugiyama: Conto sobre o assassinato de Sonia Aparecida Ferreira Sampaio
Misaki e de seus dois filhos, em dezembro de 2006, em Yaizu (Shizuoka).
Também relatei a história de um brasileiro em Nishio (Aichi)
que veio ao Japão com 12 anos de idade para morar com a mãe
e os dois irmãos. Apesar de falar japonês, ele virou marginal
e foi para a prisão. Conversando pessoalmente, ele disse que, apesar
de ter muitos sonhos, tinha dificuldade de se entrosar com a sociedade
japonesa e passava por problemas de relacionamento com os pais. O terceiro
caso é o de um suposto assalto cometido por um brasileiro de Pontaporã
(Mato Grosso, na divisa com o Paraguai). Para saber como era vir trabalhar
de Pontaporã ao Japão, fui até a cidade para entrevistar
os moradores, além de visitar a Associação Japonesa
do Paraguai. Hoje, eu me questiono se esse brasileiro teria cometido o
crime caso não tivesse vindo ao Japão.
Que
outros assuntos são tratados?
Sugiyama: Tentei retratar as dificuldades de adaptação
e da falta de afetividade das crianças brasileiras que voltaram
ao Brasil, após o divórcio dos pais no Japão. Lá,
também conheci as histórias de sucessos e de desilusões
dos japoneses que imigraram ao Brasil. Um dos lugares que visitei foi
Fukuhaku-mura (Suzano, São Paulo), onde ouvi o relato de Fumio
Oura, na época com 82 anos. Ele contou que tinha receio de se misturar
com os brasileiros, um sentimento que existe também entre os japoneses
aqui. E voltei a Registro, depois de quase 30 anos. A cidade mudou, está
modernizada e bonita. Masato Ninomiya, presidente do Ciate (Centro de
Informação e Apoio ao Trabalhador no Exterior), disse-me,
em entrevista, que o Bunkyo (Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa)
acreditava que a ida dos descendentes de japoneses em busca de trabalho
no Japão era uma boa iniciativa porque, na ocasião, havia
grande preocupação com a extinção da cultura
e da tradição japonesa no Brasil. Mas, infelizmente, a situação
foi totalmente diferente. Sabendo dessa realidade, cresceu a vontade de
escrever este livro; para mostrar que os 320 mil brasileiros no Japão
são ignorados tanto pela sociedade nipônica quanto pela brasileira.
Na minha opinião, eles não poderão ser felizes do
jeito como estão vivendo.
No último
capítulo, a senhora se questiona sobre o futuro das crianças
brasileiras, devido ao alto índice de evasão escolar. Qual
é a solução?
Sugiyama: Nós, japoneses, devemos acatar os problemas dos brasileiros
como nossos também. Não podemos criar um mundo embasado
só na economia, com as pessoas se movendo em busca apenas de dinheiro.
Existem muitas escolas brasileiras, mas o sistema de ensino é frágil.
As famílias também oferecem pouco apoio várias
têm estrutura abalada, com índices que atingem 50% de divórcios.
Durante as visitas a Yaizu (Shizuoka) e Oizumi (Gunma), notei também
a falta de união e solidariedade entre os brasileiros. Conversando
com um por um, senti o calor humano, mas, lamentavelmente, não
percebi isso no aspecto geral.
O que a
senhora conseguiu enxergar por meio das reportagens?
Sugiyama: Por exemplo, no caso de Yaizu, o que me surpreendeu é
que a vítima Sonia Misaki era uma pessoa querida até pelos
japoneses, enquanto Edson Benedito Neves, principal suspeito do crime,
era considerado um excelente abatedor de atum. Este foi um crime que envolveu
duas pessoas capacitadas, com condições para um futuro brilhante.
Soube ainda que, por trabalhar num frigorífico, os dois tinham
problemas de saúde. Neves era bastante procurado pelos brasileiros
porque emprestava dinheiro com 20% de juros. Mas era muito instável
emocionalmente. Infelizmente, não pude saber mais, pois não
consegui entrevistá-lo. Outro caso interessante foi no Asilo Ikoi
no Sono, em São Paulo. Uma senhora não quis tirar uma foto
por se sentir envergonhada ela se considerava uma derrotada por
estar naquele local. Também percebi que os brasileiros no Japão
não sentem orgulho pela sua nacionalidade, talvez porque enfrentem
grandes dificuldades para manter a dignidade. Escrevendo o livro, descobri
a importância de cultivar o sentimento de orgulho em si próprio
para educar os filhos. Aprendi também a necessidade de um adulto
saber ser paciente e ceder em nome da próxima geração.
Conversando com as crianças, notei a baixa autoestima e a falta
do sentimento de orgulho de ser brasileiro, além da falta de motivação
em frequentar uma classe multicultural nas escolas japonesas. No entanto,
a falta de orgulho e respeito ao próximo não é apenas
uma questão brasileira, mas também da sociedade japonesa.
Eu, em particular, estou diante de um problema: o meu filho que quer ir
à escola, mas não consegue. Por isso, fico pensando: como
apoiá-lo?
Você
disse que faltou espaço para mostrar a realidade dos brasileiros.
De que forma quer completar esse trabalho?
Sugiyama: Bem, como próximo projeto, aproveitando a oportunidade
de ser responsável por uma coluna na revista Nihongo, pretendo
apresentar a atuação dos estrangeiros, principalmente dos
brasileiros. Quero mostrar como eles estão trabalhando em prol
da melhoria da comunidade brasileira.
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