(Por
Cláudio Seto*)
Há
muitos e muitos anos, no tempo em que a imperatriz Gensho
reinava no Japão, morava em Mino, atual Gifu, um
lavrador de poucos recursos. Apesar de ser um rapaz muito
trabalhador, o que produzia em sua horta não era
o suficiente para o sustento dele e de seu velho pai.
O
pai também sempre foi pobre e, na idade avançada,
pouco podia fazer para ajudar o filho na roça.
O filho tratava o pai com carinho, sabia quanto ele tinha
se sacrificado pela família. Sempre sonhava com
uma maneira de dar algum conforto ao seu pai nos últimos
anos de sua vida. O velho gostava muito de saquê
(vinho de arroz), porém quase nunca sobrava dinheiro
para o moço comprar-lhe uma garrafa.
Certa
ocasião, após terminar seus trabalhos na
horta de verduras, o rapaz subiu a montanha para cortar
lenha. Como fazia de tempos em tempos, levaria a lenha
para vender na cidade e conseguir algum dinheiro para
comprar saquê para seu velho pai. Seu prazer era
ver a cara de felicidade quando seu pai sorvia apetitosamente
os goles de saquê.
O
moço encheu o carregador de lenhas, colocou-o nas
costas e começou a descer a montanha em direção
à cidade. Mas, como havia colocado muita lenha
nas costas, veio cambaleando, devido ao grande peso, e
acabou escorregando. Rolou morro abaixo até o fundo
de um vale, onde ficou desmaiado durante horas.
Mais
tarde, despertou todo dolorido e com muita sede. Nisso
prestou atenção, pois ouvia o barulho de
uma queda dágua. Saiu em direção
ao som e encontrou uma pequena fonte entre rochas e folhagens.
Fazendo das mãos uma concha, bebeu a água
da fonte e teve uma grande surpresa. Não era água
e sim saquê!
Não
acreditando no que estava acontecendo, tornou a beber.
Realmente era saquê!
Imediatamente, o moço lembrou de seu pai e de quanta
alegria ele teria saboreando aquele saquê. Então,
encheu de saquê a cabaça, que sempre carregava
na cintura para levar água ao seu trabalho.
Quando
chegou em casa, seu velho pai estava preocupado com a
demora.
Aconteceu alguma coisa para você demorar
tanto a voltar?
É difícil de acreditar no que houve.
Beba um pouco desse líquido enquanto eu conto o
que aconteceu.
O pai experimentou o líquido da cabaça e
comentou, feliz:
Esse não é o saquê que você
costuma comprar para mim. É muito mais gostoso!
Então, o filho revelou o acontecido no vale em
seus mínimos detalhes. O pai, surpreso pela narrativa,
comentou:
Isso é uma graça divina. O deus do
saquê agraciou você por ser um bom e dedicado
filho. Vamos fazer a oferenda de uma taça de saquê
no santuário e rezar a ele em agradecimento.
A
partir desse dia, todas as tardes, quando o moço
terminava seu trabalho na lavoura, ia buscar saquê
na fonte. Voltava com a cabaça cheia para casa
e fazia a alegria de seu pai, que o esperava ansiosamente.
Assim, pai e filho viveram por muitos anos em perfeita
harmonia.
A
notícia daquele insólito acontecimento espalhou-se
por todo o Japão e chegou aos ouvidos da imperatriz
Gensho, que reinou de 715 a 724. Ela resolveu ir pessoalmente
conhecer a fonte milagrosa de saquê. Ao experimentar
a água da fonte, percebeu que se tratava simplesmente
de água e nada mais. Conhecedora da história,
ela entendeu que o milagre ocorria somente com aqueles
pai e filho. Como o filho era dedicadíssimo ao
pai, o deus do saquê fazia com que o pai sentisse
o gosto de um delicioso saquê, sempre que bebia
aquela água. Então, a imperatriz determinou
que fosse construído um jardim em torno da fonte
e a batizou com o nome de Yorô, que significa tratar
bem de idosos.
Assim,
a imperatriz deu vários presentes ao moço,
por tratar o pai com muito carinho. Desde então,
nasceu o costume ainda vigente de a Casa Imperial Japonesa
premiar as pessoas que tratam os idosos com respeito e
carinho. E a Cachoeira Yorô é, ainda hoje,
um ponto turístico muito visitado no Japão.
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